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Referência Bibliográfica


ANDRADE, C. (2019) - Gaseous emanations from Azores volcanic lakes: geochemical characterization. Tese de Doutoramento no ramo de Geologia, especialidade em Hidrogeologia, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade dos Açores, 251 p.


Resumo


​No arquipélago dos Açores, constituído por nove ilhas de origem vulcânica, ocorrem numerosos sistemas lacustres, cuja génese e características hidrológicas e hidrogeoquímicas se relacionam com a origem geológica do arquipélago.

Fruto do seu enquadramento geodinâmico e geoestrutural, o arquipélago dos Açores, localizado no Atlântico Norte e, em particular, nas proximidades da junção tripla entre as placas litosféricas Norte Americana, Euroasiática e Núbia, de que resulta uma intensa atividade sísmica e vulcânica, apresenta-se como um laboratório natural para o estudo de fenómenos associados ao vulcanismo secundário. Com efeito, em várias ilhas do arquipélago ocorrem manifestações de vulcanismo secundário, nomeadamente campos fumarólicos, nascentes de águas termais e/ou gasocarbónicas, assim como zonas de desgaseificação difusa através dos solos e da superfície dos lagos, matéria esta estudada na presente dissertação.

Com o objetivo de proceder a uma caracterização e quantificação da desgaseificação difusa através dos lagos vulcânicos existentes no arquipélago dos Açores, foi realizado um estudo em 45 destas massas de água, dispersas por seis ilhas. No decurso dos trabalhos de campo foram efetuadas amostragens de água através de perfis verticais, a várias profundidades, assim como medições do fluxo de dióxido de carbono libertado à superfície destes lagos. Sempre que possível, e por forma a compreender o efeito da sazonalidade sobre os resultados obtidos, realizaram-se pelo menos duas campanhas de amostragem, uma no período de inverno e outra no período de verão.

A caracterização hidrogeoquímica permitiu constatar que alguns lagos apresentam um comportamento monomítico, com estratificação da coluna de água no período mais quente do ano, implicando a ocorrência de concentrações de dióxido de carbono mais elevadas no hipolimnion e sendo a neutralização da acidez da água promovida pela interação água-rocha, o que acarreta um enriquecimento também em bicarbonato. Já durante o inverno este processo não é observável, o que permite, assim, que ocorra uma mistura da água ao longo de toda a coluna de água, não ficando, desta forma, o CO2 retido em profundidade. Nestas condições, registam-se concentrações de CO2 dissolvido na água significativamente mais reduzidas em profundidade.

A eutrofização, processo que afeta muitos lagos no arquipélago dos Açores, também contribui para o incremento das emissões de CO2 de origem biogénica. Em particular, a presença de áreas cobertas por massas densas de algas e macrófitas em alguns lagos também é responsável pelo incremento nas concentrações de alguns parâmetros físico-químicos, em especial de dióxido de carbono.

Para além da contribuição do CO2 livre a partir da degradação da matéria orgânica acumulada nos lagos, foi ainda identificada, em alguns casos, uma componente claramente associada à contaminação da água por fluidos de origem magmática, nomeadamente na lagoa das Furnas e de Santiago (São Miguel) e na Lagoa da Furna do Enxofre (Graciosa).

As fácies hidrogeoquímicas predominantes são a cloretada sódica, que deriva principalmente da contaminação por sais de origem marinha a partir do transporte atmosférico, e a bicarbonatada sódica, embora esta última seja menos significativa, que indica uma contribuição por interação água-rocha, assim como os tipos intermédios a estes. A água da Furna do Enxofre apresenta um tipo distinto dos anteriores, nomeadamente bicarbonatada magnesiana.

No que concerne à medição do fluxo de CO2, foram realizadas 16119 medições, tendo-se registado valores entre 0 e 20960 g m-2 d-1 (média = 54 g m-2 d-1). A análise estatística através do método GSA permitiu identificar a presença de diferentes populações, que em alguns casos estão associadas com os processos hidrológicos que ocorrem nos lagos, enquanto noutros estão associadas à contaminação de fluidos vulcânicos.

Nos lagos que estratificam e onde foi possível efetuar duas campanhas de amostragens, nomeadamente uma no verão (com estratificação) e outra durante o inverno (sem estratificação), foram registadas diferenças significativas no output estimado para a emissão de CO2. Este facto explica-se pela retenção do CO2 no hipolimnion quando os lagos se encontram estratificados durante o período mais quente do ano (verão). O mesmo não ocorre em lagos pouco profundos, que não só estratificam como não denotam variações nos valores de fluxo de CO2 emitidos nos períodos de verão e de inverno.

Foram ainda relacionadas as zonas anómalas de CO2 com as estruturas tectónicas que atravessam, em alguns casos, os lagos em estudo. Foi possível concluir que algumas destas zonas anómalas coincidem com os acidentes tectónicos presentes nestas áreas, sugerindo que estas últimas são estruturas preferenciais de libertação de gases de origem profunda, com origem vulcânica/hidrotermal.

O recurso ao conteúdo em isótopos estáveis permitiu não só confirmar a origem meteórica das águas estudadas, como ainda, a partir dos valores de δ13C, concluir que uma fração do CO2 emitido nas lagoas das Furnas, da Furna do Enxofre e de Santiago é de origem profunda. Nos restantes lagos, a composição da água em δ13C demonstra que o CO2 emitido é de origem biogénica, mesmo no caso em que foram identificadas mais do que uma população de dados de fluxo de CO2.

Os valores estimados de emissão de CO2 permitem concluir que os lagos estudados emitem para a atmosfera valores entre os 0,0003 t d-1 (Algar do Carvão_1) e 600 t d-1 (Furnas_2) de CO2. Relacionando os valores de output com as áreas superficiais dos lagos, os valores situam-se entre 0,003 t km-2 d-1 (Achadas) e ~530 t km-2 d-1 de CO2 (Furna do Enxofre). Neste último caso, os valores estimados permitem sugerir que esta massa de água se posiciona entre os cinco lagos de origem vulcânica que emitem mais CO2 para a atmosfera a nível mundial. Somando a emissão de CO2 estimada de todos os lagos estudados neste trabalho, o fluxo total de CO2 libertado nos Açores corresponde a um valor estimado de ~383 t d-1.

Os resultados da presente investigação poderão servir de base à monitorização sismo-vulcânica nos Açores, uma vez que quaisquer alterações significativas nestes valores agora conhecidos podem constituir evidências de alterações em profundidade, principalmente nos sistemas vulcânicos onde se localizam estas massas de água.

Observações


Anexos